sábado, 18 de junho de 2016

Abri o livro



Abri o livro da nostalgia
A parei na folha da biografia
Era noite de festa de um dia de verão
Enquanto muitos bailavam
Minha mãe sofria
Para me dar à luz do dia
Fui nascer a Coimbra
Nessa cidade de história
E de amores proibidos, mas vividos
Fui crescendo nos verdes campos
Da beira litoral
Muito perto do mar
Fui crescendo e amadurecendo
E estudando
Até que surgiu a juventude
E muito perdida na decisão
Do gosto pelos números
E a procura do livro do meu contentamento
Que tanto procurara
Na idade da escola primária,
Dos números…
Minha mãe não os tinha,
Nem os contava
Fui criando ilusões
Então reparei
Que a vida tem crueldades
E muitas maldades
E quem não tinha padrinhos
Restava-lhe ouvir os passarinhos
Um dia tive que partir
Deixar o sonho de uma profissão
E resolvi ganhar meu pão
Porque era a única solução
Parti para Pombal
E fui trabalhar sem ganhar
E passado pouco tempo, descobri
Viver fechada numa sala
Ao som de uma máquina de escrever
Não podia ser o meu viver
Anos depois,
Com desespero (não havia trabalho)
Fui procurar outro ofício
Onde pudesse ganhar meu sustento
Lá fui para a Leiria
Ai que tormento
Ter que lavar chão
E ouvir crianças a rir
E ter que as entender
Foi uma lição de vida
Depois, anos depois fui parar a Coimbra
Essa cidade de sonho,
Muito por lá aprendi
Mas o sonho que me comandava
Mandou-me trabalhar e estudar
Porque tinha ainda muito a apreender
E quando o tempo apareceu
Lá voltei a estudar
Para melhor entender o Mundo
Muito aprendi, mas pouco me valeu
Na profissão nada apliquei
Porque sabia de mais
E ninguém me entendia
Porque não tinha padrinhos
Os anos foram passando
E fui descortinando
Que o mérito não é visto
- Na consciência de gente calada e triste -
É bom ser falador
Para vender a sua marca
Seja ela bem balofa
E até motivo de mofa
Por isso reconheci
Por muito trabalho que se faça
Só faz cansar a carcaça
E nunca encher a saca
É andar de cabeça erguida
E ver o mundo inchado
À custa do desgraçado
Que enche a barriga a pançudo
E neste percurso rude
Encontrei o livro que procurava
O do meu tempo da primária
Hoje vivo consolada
Umas vezes triste ou contente
E reconhecer que não sou nada
A não ser uma pessoa de ser
Mas digo a toda a gente
Que na vida de miserável
Se encontra o verdadeiro sentido
Porque um dia viemos à vida
Conhecer o dia a dia
Ver tudo com olhos de ver
É essa a força vencida
De ter nascido para morrer


Cidália Rdorigues

1 comentário:

  1. Olá,

    Infelismenste a vida não é fácil para quem precisa matar um leão todos os dias para sobreviver. O legal de tudo isso, é que vivendo honestamente conseguimos sobreviver sem pecados e sem remorços.

    Um abraço, paz e bem

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